abril 18, 2009

A galeria, muito vazia.

A galeria, muito vazia. Um silêncio escuro, e tantas telas para nada. Dois guardas desconfiados percebendo (ou tentando) cada movimento dado. Às vezes, seguiam, se ouvissem algum barulho. Era sol lá fora e, dentro, um breu com as tábuas corridas escuras em brilho, paredes verde-musgo, lâmpadas impotentes. Um catálogo com preços para obras. Um caderno, na sala seguinte, para assinaturas dos visitantes em outra exposição. No caderno, um poema em prosa, uma declaração de amor de um senhor que ia saindo indefinível de perto das linhas que acabava de deixar.
Aquela escuridão era um frio, muito mais que o silêncio. Um ambiente tão grande mas que não deixava ecoar nenhum barulho, nem dos pés. Como seria a vida ali dentro, por turnos? As horas ali dentro? Só os guardam sabiam. - Mas eles riam.
Nos poucos minutos despendidos ali, no isolamento do universo, na supressão do mundo, eu senti um verdadeiro desolamento imposto, um caminho único, sem saída, para estar consigo e pegar em sua própria mão para descer pelo elevador e procurar um bar.
Descemos.
E, ainda assim, nenhum gole foi tão amargo que salvasse a consciência de algum desastre; e nenhum gole foi tão perverso a ponto de causar enjôo, tonteiras e risadarias sem propósito. Tudo virou um impacto desolado e sem sentido - era aquela galeria por dentro, cheia de seus quadros e escuridão e frio silencioso, aquele ambiente inalterável e triste, sem som, sem eco, verde-musgo - com seus vários guardas que riam, riam sem parar, riam e continuam rindo na minha cara.

abril 16, 2009

Tudo, enfim, é despedida.
Estou ouvindo o silêncio, muito mais. Uma resposta do corpo. Uma prece - porque de ruídos, basta.
Tudo é adeus, tudo chega em um estágio para começar a retornar à origem, ou ainda, para começar a avançar para o final. E nada resta. Só o esforço, a ingenuidade em ter acreditado que era diferente - quando, na verdade, tudo é despedida e nada muda isto.

abril 14, 2009

Há salvação na dor . Restuir-se pede um sofrimento de lágrima quente piegamente a correr pelo lado esquerdo da face, às escondidas para não mostrar fraqueza. A dor dá a mão e levanta. A felicidade é enganação por um tempo irrestrito. Ninguém quer ilusão.

abril 11, 2009

Da procura

É provável que a mulher que você procura esteja ela toda em você; que a libertina com a qual você sonha, e perde as noites entre os cigarros incessantes que acende, esteja ela completa em você. Com a diferença de que você não consegue perceber que o Inferno está rubramente por dentro, por dentro da sua boca, no calor da língua do beijo da falta de ar e da pressa. Acontece uma busca vã, assim; e você acredita que vai encontrá-la em qualquer esquina, noite, bar - encontrar a outra mulher que não a que reflete no outro lado do espelho quando você entra no banheiro da boate para retocar o seu batom. A mulher que aperece no espelho, com o lápis borrado e com um borrão míope de bebida e cansaço da noite, é a mulher que você - sem notar - ambiciona e lança entre os cabelos das outras, lança nos finos pulsos que segura entre um raio de luz estroboscópica e outro, lança entre um toque irregular na cintura de alguém que passa ao lado no embalo de uma música. Mas você não percebe que nenhuma delas guarda o que você deseja; que nenhuma delas vai pagar a entrada e a carta de bebidas, pegar a chave do carro na bolsa, te mandar sentar no banco da frente e te levar para passar as quatro horas mais interessantes da madrugada, privativamente. Nenhuma delas, por mais que se tente ou se procure - ou melhor, por mais que você tente, ou que você procure - nenhuma delas vai se desprender do fato da pluralidade de sensações, e de parceiros, e de parceiras, e de atividades, e de conversas, e de bebidas, e de emoções, e de todo o resto de uma vida que vinga sob muitas lágrimas escondidas mas sob uma vantagem perfeita de se estar viva. Não; nenhuma delas é resposta. A libertina por você procurada é você própria. Mas você não aceita, porque não aceitamos sombra ou noite.

abril 04, 2009

Sem limites

Não existe meu e nem minha, porque meu ou minha são limite, e nenhuma relação pode ousar marcar limite, mas um infinito que esteja sempre disposto a qualquer surpresa. Curiosamente, existe seu, existe teu, sua tua completamente tua. Ainda que haja a impossibilidade de, tomando alguém como teu ou tua, empregue-se o meu, ou minha.
A subversão de sentidos acontece na Arte, às vezes na vida. Há impacto quando submetemos o que chamamos vida a uma intensidade de Arte. É aí, então, que são as grandes descobertas, os grandes encontros e os grandes sabores. Dificilmente acontece - ou porque é mais prático levar a vida dentro de limites; ou porque falte proximidade com a Arte na rotina das pessoas. De qualquer forma, cabe a cada um a escolha por se fazer.